Anestesia em Procedimentos de Cirurgia Robótica: Desafios e Soluções

A cirurgia robótica tem ganhado cada vez mais espaço na prática médica, especialmente em áreas como urologia, cirurgia geral, ginecologia e cardiologia. Essa modalidade oferece maior precisão, redução de tremores e melhor visualização anatômica, o que resulta em um potencial de menor invasividade e recuperação mais rápida para o paciente. Contudo, essa evolução tecnológica também demanda ajustes específicos na estratégia anestésica. Neste texto, discutiremos os principais desafios enfrentados pelo anestesiologista em procedimentos robóticos e as soluções adotadas para garantir a segurança e a eficácia de cada intervenção. 

1. Características Especiais da Cirurgia Robótica

Os sistemas de cirurgia robótica, como o Da Vinci Surgical System, consistem em braços mecânicos controlados por um cirurgião que opera a partir de uma estação de trabalho. Esses braços utilizam instrumentos de alta precisão e câmeras que fornecem visão tridimensional do campo cirúrgico.Diferentemente das cirurgias convencionais laparoscópicas ou abertas, os procedimentos robóticos podem demandar posições específicas do paciente (por exemplo, Trendelenburg ou Trendelenburg reverso acentuados) e pressões pneumoperitoneais elevadas para maximizar o espaço de atuação dos instrumentos. Esses fatores afetam diretamente a dinâmica cardiovascular e respiratória do paciente, tornando o manejo anestésico um ponto crítico para o sucesso da cirurgia. 

2. Desafios Anestésicos em Cirurgias Robóticas

2.1 Posição do Paciente e Alterações Hemodinâmicas

  • Posicionamento extremo: Em muitos casos, a cirurgia robótica exige posições como a Trendelenburg pronunciada (cabeça declinada) para melhor acesso pélvico ou abdominal. Nessa posição, há aumento do retorno venoso ao coração, o que pode elevar a pressão intracraniana e intraocular, além de predispor a edema facial e de vias aéreas.
  • Monitorização hemodinâmica: Diante dessas variações, o anestesiologista precisa avaliar continuamente a pressão arterial, a frequência cardíaca e o débito cardíaco, estando preparado para intervir em casos de sobrecarga ou instabilidade circulatória.

2.2 Pressão Pneumoperitoneal e Comprometimento Respiratório

  • Insuflação de CO: A criação de um pneumoperitônio (geralmente com dióxido de carbono) aumenta a pressão intra-abdominal, reduzindo a complacência pulmonar e elevando o risco de hipoventilação.
  • Alcalose respiratória ou hipercapnia: Se não houver ajuste adequado da ventilação, o CO₂ pode se acumular, causando hipercapnia, acidose respiratória e efeitos hemodinâmicos indesejados. Por outro lado, uma ventilação excessiva em busca da normocapnia pode levar à alcalose respiratória, igualmente perigosa.
  • Ventilação protetora: Estratégias como redução do volume corrente e uso de pressões de plateau baixas ajudam a proteger o tecido pulmonar, mas exigem ajustes finos para manter oxigenação satisfatória.

2.3 Longa Duração e Limitação de Acesso ao Paciente

  • Posicionamento fixo: Uma vez iniciada a cirurgia e acoplados os braços robóticos, o acesso direto ao paciente torna-se limitado. Caso ocorra alguma intercorrência, como queda de via aérea ou necessidade de compressões torácicas, a resposta precisa ser imediata, envolvendo protocolos bem definidos para desacoplamento do sistema robótico.
  • Manutenção da anestesia: Procedimentos robóticos complexos podem se estender por horas, exigindo monitorização criteriosa da profundidade anestésica (por exemplo, via BIS ou índice de entropia) e ajustes constantes das drogas utilizadas.
 

3. Estratégias para Superar os Desafios

3.1 Planejamento Anestésico Minucioso

  1. Avaliação pré-operatória: Identificar fatores de risco cardiorrespiratórios, presença de doenças pré-existentes e limitações ortopédicas para posicionamento.
  2. Seleção de drogas e técnicas: Pode incluir anestesia geral com agentes inalatórios de última geração ou anestésicos venosos (como propofol em TCI), associada a relaxantes neuromusculares de ação intermediária e monitorização neuromuscular para ajuste preciso das doses.
  3. Estratégias de analgesia multimodal: Incluem opioides, anti-inflamatórios, bloqueios regionais e anestésicos locais, visando conforto no pós-operatório e menor dependência de doses altas de opioides.

3.2 Monitorização Avançada

  • Monitorização hemodinâmica invasiva: O uso de cateter de artéria radial para pressão arterial contínua e, em alguns casos, sistemas de débito cardíaco minimamente invasivos ajudam na detecção precoce de instabilidades.
  • Capnografia e gases anestésicos: Fundamental para adequar a ventilação de modo a manter níveis seguros de CO₂.
  • Índices de profundidade anestésica: Reduzem a chance de consciência intraoperatória e permitem a titulação mais apurada de fármacos.

3.3 Equipe Bem Treinada e Protocolos de Emergência

  • Treinamento multidisciplinar: Envolve anestesiologistas, cirurgiões e enfermeiros para gerenciar complicações como hipotensão severa, arritmias ou necessidade de reverter rapidamente a posição do paciente.
  • Checklists de segurança: Incluindo etapas pré-cirúrgicas para confirmar posicionamento, fixação de dispositivos e planos de contingência.
  • Comunicação constante: Salienta-se a importância de manter canais abertos entre a equipe, especialmente ao lidar com ajustes do robô, mudanças no posicionamento ou variações hemodinâmicas.
 

4. Vantagens e Perspectivas Futuras

Apesar dos desafios, a cirurgia robótica oferece benefícios significativos para o paciente, como incisões menores, recuperação mais rápida, menos dor pós-operatória e menor risco de complicações relacionadas a grandes acessos cirúrgicos. Para o anestesiologista, a tendência é que os avanços em monitorização, softwares preditivos e integração de sistemas de Inteligência Artificial auxiliem no ajuste contínuo dos parâmetros anestésicos, tornando o procedimento cada vez mais seguro.No futuro, podemos esperar protocolos ainda mais refinados para otimizar a hemodinâmica e a ventilação em posições extremas, bem como sistemas robóticos capazes de se reajustar automaticamente ao detectar alterações fisiológicas do paciente, por meio de comunicação avançada com monitores de parâmetros vitais. 

Conclusão

A anestesia em procedimentos de cirurgia robótica envolve uma série de desafios únicos, desde o posicionamento extremo do paciente até as limitações de acesso durante a operação. Entretanto, com planejamento minucioso, monitorização avançada, protocolos de emergência bem estabelecidos e uma equipe multidisciplinar treinada, é possível superar esses obstáculos e garantir a segurança do paciente. À medida que a tecnologia evolui, a expectativa é que a integração entre robótica, sistemas de monitorização e profissionais altamente capacitados permita um nível ainda maior de precisão, conforto e rapidez na recuperação, consolidando a cirurgia robótica como uma das principais modalidades cirúrgicas do futuro.

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