Introdução ao Cenário de Anestesia e Pancreatite Aguda
A pancreatite aguda é um processo inflamatório do pâncreas, que pode variar de formas leves e autolimitadas até quadros severos com necrose pancreática, falência de múltiplos órgãos e alta letalidade. As causas mais frequentes incluem cálculos biliares, abuso de álcool e hipertrigliceridemia, embora etiologias menos comuns também ocorram. Em casos graves, o paciente pode necessitar de intervenções cirúrgicas ou endoscópicas para remover necroses, drenar abscessos ou corrigir complicações. Nesse contexto, Anestesia e Pancreatite Aguda formam um binômio desafiador, uma vez que a resposta inflamatória sistêmica e as alterações metabólicas do paciente exigem um planejamento anestésico cuidadoso para preservar a estabilidade hemodinâmica e minimizar riscos no perioperatório.Sob a ótica da pancreatite aguda, uma das preocupações mais marcantes recai sobre a hipovolemia — decorrente da terceira espaço (o sequestro de fluidos no retroperitônio), das perdas volêmicas pela inflamação sistêmica e do prejuízo na função de outros órgãos, como rins e pulmões. O anestesiologista, portanto, deve estar atento aos distúrbios eletrolíticos, à acidose metabólica e aos efeitos de medicações necessárias para controlar a dor e a resposta inflamatória. Além disso, intervenções cirúrgicas podem ocorrer em caráter de urgência ou emergência, quando há suspeita de complicações graves, como necrose infectada ou síndrome compartimental abdominal.Este texto discorrerá sobre os aspectos fisiopatológicos relevantes da pancreatite aguda e as repercussões para a condução anestésica, passando pela avaliação pré-operatória e a escolha de agentes farmacológicos. Também abordaremos possíveis particularidades quando o paciente demanda procedimentos menores, incluindo intervenções endoscópicas ou odontológicas, mas ainda sob efeito do processo inflamatório sistêmico. Ao final, pretende-se fornecer um panorama claro de como conduzir Anestesia e Pancreatite Aguda com segurança, contribuindo para a recuperação mais rápida e efetiva do doente.Fisiopatologia da Pancreatite Aguda e Repercussões Sistêmicas
A pancreatite aguda origina-se, na maioria dos casos, quando enzimas digestivas (como a tripsina) são ativadas precocemente no interior do pâncreas, promovendo autodigestão tecidual, edema e liberação de mediadores inflamatórios. Esse processo local pode progredir para um estado inflamatório sistêmico, assemelhando-se a um choque séptico, com vasodilatação, extravasamento capilar e hipovolemia. De maneira correlata, a dor intensa e a liberação de citocinas elevam o gasto energético e alteram a homeostase, tornando o doente suscetível a colapsos hemodinâmicos e disfunções orgânicas múltiplas.No âmbito de Anestesia e Pancreatite Aguda, a hipovolemia e a redução da complacência pulmonar despontam como grandes obstáculos. A dor abdominal intensa pode reduzir os movimentos respiratórios e, com frequência, induzir hipoventilação e atelectasias, potencializando o risco de pneumonia. Em casos de maior gravidade, surgem coleções líquidas e necroses pancreáticas, que podem requerer drenagem cirúrgica ou endoscópica, cada uma com implicações próprias na estabilização anestésica.Ademais, o metabolismo de glicose pode estar severamente afetado, pois a função endócrina pancreática compromete a regulação da insulina e do glucagon. O anestesiologista, assim, precisa monitorar os níveis glicêmicos e compensar flutuações bruscas. Outro desafio reside no desequilíbrio de fluidos e eletrólitos, incluindo hipocalcemia e hipomagnesemia, que influenciam a contratilidade cardíaca e podem desencadear arritmias ou hipotensão refratária. Portanto, compreender a fisiopatologia da pancreatite aguda e suas repercussões sistêmicas assegura uma condução anestésica adaptada à elevada complexidade do quadro clínico.Avaliação Pré-Anestésica e Otimização Clínica
A avaliação pré-operatória de pacientes com pancreatite aguda demanda abordagem rápida e objetiva, principalmente se o ato cirúrgico for emergencial, a exemplo de uma drenagem de necrose infectada ou controle de complicações abdominais. O anestesiologista verifica os sinais vitais, parâmetros de perfusão (pressão arterial, frequência cardíaca, débito urinário) e investiga marcadores de gravidade, como lactato sérico, proteína C reativa e escore de Apache II ou BISAP, que estimam o risco de insuficiência orgânica. A aferição dos níveis de cálcio, magnésio, fósforo e potássio revela distúrbios eletrolíticos decorrentes do processo inflamatório.Outro ponto crucial se relaciona ao estado de hidratação: em função do “terceiro espaço” gerado pela inflamação, é comum haver hipovolemia grave. Também se considera se o paciente apresenta disfunção renal ou respiratória, por vezes requerendo suporte ventilatório e hemodiálise temporária. Em Anestesia e Pancreatite Aguda, a ocorrência de dor severa e intermitente analgesia com opioides no pré-operatório influencia a dose de fármacos sedativos no intraoperatório; logo, a anamnese deve rastrear se há tolerância aumentada.Alguns doentes podem estar em jejum prolongado e desnutrição incipiente devido a náuseas e vômitos, exigindo correção do estado nutricional ou reposição de micronutrientes. Se houver suspeita de infecção, hemoculturas e antibióticos adequados devem ser administrados conforme o protocolo da equipe de infectologia. Nessa etapa, a comunicação com cirurgiões e intensivistas define o momento ideal para intervir, assegurando que haja estabilização hemodinâmica mínima antes de expor o paciente ao estresse da cirurgia.Interações Farmacológicas e Reposição Volêmica
A hipovolemia maciça e a inflamação sistêmica da pancreatite aguda podem alterar profundamente a farmacocinética dos anestésicos. Em Anestesia e Pancreatite Aguda, opioides, sedativos e relaxantes musculares podem exibir perfis atípicos de distribuição e metabolismo, exigindo titulações graduais e monitorização intensiva. Por exemplo, o uso de propofol deve ser criterioso se o paciente apresentar hipotensão ou disfunção miocárdica, enquanto a cetamina pode ser benéfica por sustentar a pressão arterial e oferecer analgesia, embora se deva ter atenção à frequência cardíaca em cardiopatas.Quanto à reposição volêmica, utiliza-se cristaloides balanceados (como Ringer lactato ou Plasma-Lyte) para reconstituir o volume intravascular. Em cenários de hipotensão refratária, recorre-se a vasopressores (noradrenalina) sem negligenciar a possibilidade de edema pulmonar. A monitorização invasiva, incluindo cateter arterial e avaliação da PVC (pressão venosa central), ajuda a dosar fluidos em tempo real, evitando tanto a hipoperfusão quanto a hiper-hidratação, esta última lesiva ao parênquima pulmonar e associada a piores desfechos.Caso haja coagulopatia ou sangramento, transfusões de hemocomponentes devem seguir protocolos rigorosos, já que a pancreatite grave pode cursar com trombocitopenia e disfunção plaquetária. A acidose metabólica, decorrente da hipoperfusão tecidual e do catabolismo exacerbado, é corrigida com bicarbonato e, principalmente, através da restauração do fluxo sanguíneo adequado. Assim, equilibrar fluidos, eletrólitos e aminas vasoativas é a pedra angular de uma anestesia segura no paciente com pancreatite.Escolha da Técnica Anestésica: Geral ou Regional
Nos procedimentos cirúrgicos de maior porte voltados ao controle de complicações pancreáticas — como necrosectomias, drenagens ou laparotomias amplas — a anestesia geral predomina. Permite controlar a via aérea, a ventilação mecânica e a infusão de sedativos e analgésicos conforme a evolução do ato, o que se mostra essencial se o doente estiver em choque ou com reserva hemodinâmica comprometida. A indução deve ser suave, usando agentes de mínima depressão cardiovascular como etomidato ou cetamina, aliada a opioides de curta ou média duração (fentanil, alfentanil).Por outro lado, bloqueios regionais, como a peridural torácica, podem oferecer analgesia benéfica em cirurgias abdominais, reduzindo a resposta inflamatória e a necessidade de opioides sistêmicos. Contudo, é vital avaliar coagulopatia e estabilidade hemodinâmica; a punção neuraxial num doente hipovolemico ou séptico acarreta risco de hipotensão grave e dificuldade de correção rápida. Em cenários mais complexos, a analgesia com cateter peridural associada a baixas doses de anestésicos locais pode auxiliar a ventilação e o conforto, mas sempre sob vigilância do equilíbrio volemico.Em intervenções menores — drenagens percutâneas orientadas por imagem ou endoscopias — a sedação monitorada associada a analgesia local pode bastar, desde que o paciente mantenha estabilidade e via aérea preservada. O anestesiologista vigia parâmetros como pressão arterial, frequência cardíaca e saturação de oxigênio para detectar qualquer sinal de deterioração. Consequentemente, em Anestesia e Pancreatite Aguda, a seleção do método anestésico deve considerar a urgência, o estado metabólico e a suscetibilidade a hipotensão ou arritmias, priorizando a segurança e a analgesia eficaz.Abordagem Odontológica e Pancreatite Aguda
É relativamente incomum que pacientes com pancreatite aguda demandem intervenções odontológicas de urgência. Contudo, pode ocorrer a necessidade de drenagem de abscessos orais ou cuidados paliativos em pacientes que apresentam dor e risco de infecção bucal adicionada a um quadro já complexo. Nessa situação, o anestesiologista deve avaliar a estabilidade do doente e se a pancreatite encontra-se controlada ou em fase aguda crítica. Caso os desequilíbrios hemodinâmicos sejam acentuados, transfere-se o tratamento odontológico para ambiente hospitalar com monitorização básica (oximetria, ECG, pressão arterial não invasiva).Se a sedação for indicada para realização de curativos ou restaurações, mantém-se a vigilância sobre hipotensão e reatividade dos agentes sedativos, pois a depleção volumétrica pode intensificar a sensibilidade a benzodiazepínicos ou opioides. Frequentemente, a abordagem com anestesia local e mínima sedação é suficiente, evitando oscilações bruscas hemodinâmicas. Se houver suspeita de sangramento gengival excessivo, coagulopatias devem ser descartadas ou corrigidas, dado que a pancreatite severa pode desregular múltiplos mecanismos homeostáticos.Outra consideração recai na dor orofacial, que pode coexistir com a dor abdominal intensa, elevando a resposta adrenérgica e dificultando o repouso. O cirurgião-dentista e o anestesiologista, nesse sentido, almejam resolver o foco doloroso sem prolongar o procedimento ou induzir sobredosagem de analgésicos sistêmicos. Assim, em Anestesia e Pancreatite Aguda em ambiente odontológico, a cautela com sedação, reposição fluídica e analgesia pontual definem uma experiência menos traumática para o paciente.Manejo Intraoperatório e Monitorização Avançada
Nos procedimentos cirúrgicos extensos, a exemplo de necrosectomias para remover tecido pancreático necrosado, a monitorização invasiva costuma ser imprescindível. O cateter arterial assegura aferição contínua da pressão, indicando se há necessidade de vasopressores ou de maior infusão de fluidos. O acesso venoso central, por sua vez, orienta a pressão venosa central e simplifica a infusão de drogas vasoativas em regime de bomba. Em casos selecionados, se houver disfunção cardíaca associada, o uso de métodos de débito cardíaco (termodiluição, ecocardiografia transesofágica) pode auxiliar na adaptação fina das variáveis hemodinâmicas.O controle térmico é fundamental em Anestesia e Pancreatite Aguda, pois estados inflamatórios intensificam a produção de calor, mas a hipotermia iatrogênica agrava coagulopatia e acidose metabólica. Portanto, líquidos aquecidos, mantas térmicas e medidas de prevenção de perda de calor ajudam a manter a temperatura corporal ideal. A analgesia recorre a opioides titulados e possivelmente associada a infusões de lidocaína ou cetamina, gerenciando o amplo impacto doloroso dos procedimentos abdominais.Nos casos em que se detecta ou suspeita de hipertensão abdominal (síndrome compartimental), a ventilação mecânica deve evitar pressões elevadas que aumentem ainda mais a pressão intraperitoneal, prejudicando a perfusão renal e mesentérica. Ajustes na PEEP e no volume corrente são feitos passo a passo, monitorando a saturação de oxigênio e a complacência pulmonar. Em síntese, a condução anestésica no intraoperatório envolve controlar dor, perfusão e oxigenação, sempre de olho na evolução do processo inflamatório e no risco de choques ou arritmias.Exemplos Práticos e Relatos de Casos
Rememoro um caso de pancreatite aguda grave em uma paciente de 50 anos, com hipertrigliceridemia, evoluindo para necrose pancreática. Precisou de laparotomia e necrosectomia após 14 dias de tratamento clínico infrutífero. Ao chegar no centro cirúrgico, apresentava uso de noradrenalina para manter PAM de 65-70 mmHg. A anestesia foi induzida com etomidato e fentanil, complementando com rocurônio. Mantivemos TIVA (propofol, remifentanil) e monitorização arterial invasiva, reposição hídrica equilibrada e vigilância do lactato para avaliar perfusão. O procedimento durou 3 horas; houve perda moderada de sangue e fluidos, corrigida com cristaloides aquecidos. Ela acordou com estabilidade relativa e seguiu para UTI, onde, dias depois, apresentou melhora consistente.Noutro momento, em um paciente com pancreatite biliar leve, mas dor intratável, o cirurgião indicou colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE) para desobstrução. Optamos por sedação profunda com propofol em bomba, monitorizando via capnografia. O procedimento foi rápido, sem flutuações bruscas de pressão arterial, e o doente permaneceu consciente e cooperativo ao final, com analgesia adequada. Esse relato ilustra como a intensidade e a fase da pancreatite ditam a complexidade anestésica: quadros leves podem demandar sedação monitorada, enquanto formas graves requerem todo um aparato de suporte hemodinâmico e monitorização avançada.Pós-Operatório e Recuperação
Encerrada a cirurgia, o paciente com pancreatite aguda grave segue para uma unidade de terapia intensiva ou semi-intensiva, pois o risco de disfunções orgânicas e complicações infecciosas persiste. A analgesia contínua, com cateter epidural ou infusões de opioides, visa controlar a dor abdominal intensa, facilitando a respiração e evitando a exaustão muscular. Caso haja fístulas pancreáticas ou coleções residuais, a equipe monitoriza secreções e drenagens abdominais, buscando sinais de infecção ou deiscência de suturas.O suporte nutricional precoce, preferencialmente via enteral, favorece a recuperação da barreira intestinal e diminui a translocação bacteriana. Se o paciente apresentar falência orgânica, como insuficiência renal ou pulmonar, a condução passa a envolver diálise, ventilação mecânica prolongada e suporte vasopressor de longo prazo. Em Anestesia e Pancreatite Aguda, a transição do período intraoperatório para o pós-operatório continua requerendo vigilância sobre fluidos e ajustes de analgesia, evitando hiper-hidratação ou depressão respiratória.À medida que a inflamação regride, a mobilização precoce e a fisioterapia respiratória auxiliam na prevenção de atelectasias e tromboses venosas. A curva de melhora pode ser lenta, e, em casos de necrose ou complicações tardias, reabordagens cirúrgicas podem ser necessárias. O anestesiologista colabora com a equipe multidisciplinar, ajustando medicações antieméticas, sedativos e analgésicos conforme a evolução. Ao final, a alta hospitalar ocorre quando a dor e a infecção se encontram controladas, e a função orgânica retorna a patamares aceitáveis.Conclusões e Perspectivas Futuras
A interface entre Anestesia e Pancreatite Aguda exige abordagem criteriosa, ancorada na estabilização hemodinâmica, no controle da dor e na manutenção de parâmetros fisiológicos adequados ao desfecho cirúrgico ou de intervenção. O manejo do paciente com inflamação pancreática severa passa pela análise da repercussão sistêmica do processo e pela adoção de técnicas anestésicas que minimizem hipotensão, acidose e risco de edema pulmonar. A possibilidade de associar analgesia regional, sempre considerando a presença ou não de distúrbios de coagulação ou instabilidade, complementa a analgesia sistêmica e otimiza o alívio da dor sem depressão excessiva da respiração.À medida que as terapias minimamente invasivas avançam — como drenagens percutâneas guiadas por imagem —, a necessidade de grandes laparotomias tende a recuar, tornando a sedação monitorada e a anestesia geral de curta duração mais comuns. Esse movimento sugere uma tendência de menor agressão cirúrgica, além de reduzir a exposição a líquidos de infusão e fármacos. Entretanto, em casos de necrose extensa ou complicações abdominais graves, ainda prevalecem cirurgias extensas, exigindo toda a infraestrutura de monitorização e suporte intensivo no intra e pós-operatório.Para aprofundar-se em protocolos anestésicos e discutir casos clínicos referentes ao tema, mantenho um Blog com reflexões e literaturas recentes. Se houver necessidade de avaliação especializada em anestesia para pancreatite ou outras patologias complexas, atendo no consultório na Av. Dr. Arnaldo, 1887 – Sumaré – São Paulo – SP, com agendamento via Telefone/WhatsApp: (11) 95340-9590 ou contato@ivanvargas.com.br. Em suma, Anestesia e Pancreatite Aguda demanda conhecimento fisiopatológico, precisão na reposição volêmica e analgesia refinada para garantir que o paciente enfrente o procedimento com segurança e se recupere plenamente da inflamação e de suas repercussões.Avaliação pré-anestésica
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